Maior potência produtora de alimentos do mundo, o Brasil ainda precisa trabalhar no marketing do seu agronegócio e aprender a comunicar, da porteira para fora, sobre a sua cadeia produtiva.
Essa foi a conclusão do primeiro dia de discussão do Brazil Agribusiness International Meeting, evento virtual promovido pelo Lide Business Units, com participação de representantes do Reino Unido, Alemanha e Brasil (Paraná e Mato Grosso). Os desafios agroambientais foram os temas centrais do debate nesta terça-feira (23/2).
“Um estudo da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) e USDA revelou que, para acabar com a fome do mundo em 10 anos, a oferta de alimento tem que crescer 20%. O Brasil teria que aumentar suas exportações em 40%, porque somos a grande solução para o combate na fome no mundo. O que está faltando aqui é uma atuação diplomática e política do nosso presidente (Jair Bolsonaro), que em parte é suprida pela ministra (da Agricultura) Tereza Cristina”, afirmou o ex-ministro de Desenvolvimento, Inovação e Comércio Exterior, Luiz Fernando Furlan.
Segundo ele, apesar de grande fornecedor de matérias-primas, o Brasil não conseguiu criar marcas e multinacionais brasileiras do agronegócio reconhecidas mundialmente, sendo esse um dos maiores desafios do setor para sua imagem fora do país.
“O maior processador de café do mundo é a Alemanha, em valor, que não tem um pé de café plantado, mas construiu máquinas e estrutura para isso. Essa lacuna de marcas e empresas brasileiras multinacionais é um grande desafio que temos hoje”, disse Furlan.
Plínio Nastari, fundador e presidente da consultoria agrícola Datagro, salientou que essa situação se dá pela ineficiência de comunicação do agronegócio brasileiro ao público consumidor e aos mercados.
Desmatamento
Vilão, vítima ou solução? Quando o assunto é desmatamento, o Brasil é um pouco dos três, na avaliação do professor sênior de agronegócio no Insper e coordenador do centro Insper Global, Marcos Jank. Segundo ele, a imagem internacional do país “nunca esteve tão ruim”, o que é curioso para quem teve uma das revoluções agrícolas mais eficientes do mundo.
“Vilão porque, em 2020, o Brasil ainda não conseguiu regularizar a posse de terra no país, um problema que já dura há décadas, especialmente na região Norte. Isso torna o controle do desmatamento muito frágil. Por outro lado, temos o Código Florestal, que de fato é muito rígido, mas que não foi implementado até hoje nos Estados. Se tivesse sido feito isso, tenho certeza de que o cenário seria outro”, explicou.
Na outra ponta, o Brasil tem nas mãos as soluções para essas questões. Com mais de 170 milhões de hectares de pasto e 70 milhões de hectares de lavouras, o país é capaz de produzir em sistema de integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF) em terras que há 20 anos ninguém imaginava fazer.
Na avaliação de Jank, a questão ambiental brasileira já não é mais um tema agroambiental e sim política e financeira. “A gente
precisa atacar de frente o desmatamento ilegal e a questão do Código Florestal e melhorar os mecanismos de comando e controle. O problema é que esses são os fatores que estão agredindo a imagem do Brasil e, com isso criando um problema de descapitalização das empresas. No mundo rico, começa a haver travas de supermercados internacionais, fundos que dizem que não vão mais colocar dinheiro no Brasil. As empresas que estão mais expostas começam a criar seus sistemas blindados, controlando seus fornecedores”, ressaltou.
A Europa, embora venha reduzindo as suas compras de produtos brasileiros nas últimas décadas, tem excluído países que estão na posição de vilão do desmatamento. Mas Jank observa que, em 2020, apesar da pandemia, o Brasil registrou o segundo melhor ano na história em exportações do agro.
Os negócios totalizaram R$ 101 bilhões, dos quais 66% das vendas externas foram para a Ásia. Apenas a China foi responsável por 36% das compras do Brasil, representando um crescimento de 8% em comparação a 2019. “Só não fizemos mais porque tivemos problema no milho”, acrescentou Jank.
Enquanto isso, as exportações para os países ricos recuaram 4% no ano passado. Isso porque a Europa, que em 2000 comprava 40% das vendas externas brasileiras e 70% da soja do país, hoje representa cerca de 16% das exportações e menos de 20% das compras de oleaginosa brasileira.
“As exportações para a Europa vêm caindo ano a ano. Apesar disso, ganha importância na formação de opinião sobre o Brasil, e esse é um ponto bastante crítico”, destacou Jank.
Jank ressaltou, ainda, a recente aprovação do “Green Deal”, o novo pacto ecológico europeu que propõe 50 medidas para que o bloco se torne o primeiro continente neutro em carbono até 2050, tendo parâmetros que estão sendo seguidos por Estados Unidos e China.
“Isso vai criar toda uma frente na OMC (Organização Mundial do Comércio), na Conferência do Clima, G20, sempre com uma agenda que vai atacar países que tem desmatamento. A Europa é a grande puxadora dessa agenda e entendo que a gente deveria trabalhar em fazer a lição de casa, desde a parte pública até os temas de bioeconomia, rastreabilidade, monitoramento, e o Brasil conseguir melhorar seu diálogo com a Europa”, finalizou Jank.
Fonte: https://revistagloborural.globo.com/